Por Valquiria Miguel Luchezi (professora do 1° ano – Ensino Fundamental I)

 

Em 2019, elaboramos um planejamento que contemplasse o novo espaço do CSL. Um lugar com muito verde, espaço e possibilidade de exploração. Tudo isso nos deixou eufóricos e com muita vontade de colocar em prática essas ideias, que a princípio, estavam no papel.  

 

O ano de 2020 começou, iniciamos uma exploração nas dependências do Colégio com o intuito de observar o novo cenário e como era composto, pois um dos objetivos de aprendizagem e desenvolvimento era a identificação das mudanças que ocorrem nas plantas, nas árvores, na vegetação das praças ao longo do ano com o auxílio das tecnologias digitais de informação. Então, iniciamos essa atividade com as crianças, explorando as dependências do Colégio, que seriam ampliadas à medida que os meses fossem passando. A ideia era continuar essa exploração nas ruas do colégio, nos institutos vizinhos, até chegarmos ao Parque do Ibirapuera.  

Acontece que, uma nova realidade chegou de repente e precisamos nos adaptar e redefinir o planejamento. A pandemia era a grande preocupação e o COVID-19 estava circulando. Com isso, precisamos suspender as aulas presenciais. Passamos a enfrentar um grande desafio: conviver com um vírus que nos afastou do contato pessoal, dos abraços, dos encontros de família e do contato com os amigos e, ao mesmo tempo, desenvolver atividades  que possibilitassem o aprendizado e mantivesse viva a paixão e a curiosidade das crianças pelo mundo que os cerca.

Com isso, criamos possibilidade de uma nova rotina: aulas remotas. Agora, o local de exploração e descobertas passou a ser a moradia. 

Ao revisar o planejamento, começamos um movimento com as crianças que vislumbrasse o estar ao ar livre mesmo dentro de suas moradias, nosso novo local de exploração: olhar pela janela e refletir sobre questões que contemplassem a observação da vegetação e das construções, ou seja, a composição do cenário da moradia e seu entorno, já que havíamos iniciado esse olhar exploratório no Colégio. Valia observar as árvores na rua ou um vaso com plantas e flores e até fazer um tour virtual ao Jardim Botânico.

Esse olhar poderia contemplar, também, o formato, o tamanho e a cor das folhas dessas plantas e vegetação. O olhar é uma das bases da observação em Ciências da Natureza, e a observação o ponto central para o desenvolvimento do pensar e fazer científico. A observação permite nos darmos conta de padrões que ocorrem na natureza, por exemplo, e possibilita o surgimento de questões, o primeiro ponto para uma investigação: querer saber por que as coisas são como são. 

Num segundo momento, fizemos um novo convite: trocar a janela, observar tudo novamente, e comparar os detalhes observados nos dois momentos. Dessa vez, contemplaríamos um outro objetivo de aprendizagem e desenvolvimento que era nomear os órgãos sensoriais. Então, além de olhar pela janela e perceber como esse cenário era composto, as crianças realizaram experimentos para responder questões em que pudessem saber que o vento, o som e o cheiro existem mesmo que a gente não possa vê-los. Levantaram hipóteses e registraram descobertas até com os olhos vendados. 

As crianças “observaram” o vento, através do balanço das folhas, registraram o cheiro, identificando perfume das pessoas, das flores e do ambiente, o cheiro da fumaça ou da comida. O registro do som foi feito, escutando e diferenciando o som dos pássaros, dos carros e das pessoas.  

Nesse novo contexto, onde a moradia passou a ser lugar de exploração e descobertas, a cozinha passou a ser o laboratório: as crianças foram convidadas a cheirar e degustar variados alimentos e descobrir novos sabores, de olhos abertos e de olhos vendados, assim as descobertas ficaram mais desafiadoras.  

E, com isso, a curiosidade permaneceu no olhar e nas ações das crianças, mesmo remotamente. Comentários das famílias foram recebidos e que nos mostrou que atingimos nossos objetivos mesmo em um cenário tão complexo.

 

“Olhando a paisagem pela janela: Luísa observou os prédios vizinhos, as casas, as árvores. Que perto da casa dela tem farmácia, supermercado e lojas. Pessoas andando pela calçada e alguns carros passando na rua. Aprendendo sobre os órgãos dos sentidos: com o rosto na janela sentiu o vento, na cozinha sentiu o cheiro da comida, olhando a paisagem pela janela observou tudo ao redor, e ouviu os barulhos da casa. Degustando os alimentos nas aulas de Ciências: adorou degustar os alimentos, inclusive ela anda provando muitos alimentos para saber se gosta ou não. Algumas vezes se surpreende que gosta e outras vezes, não gosta. Mas sempre digo que o importante é provar várias vezes. E ela está aceitando bem! Estas atividades sempre ajudam na alimentação.” – Carolina Albaneze, mãe da Luísa Albaneze – 1.º ano.

 

“Queria contar o sucesso da atividade de Ciências e dividir minha alegria com você. Após assistir ao vídeo, F saiu correndo para pegar os alimentos e saiu provando o que gosta e o que não gosta. Ele provou vários! Foi direto pra cozinha fazer sucos e outras experiências. Provou limão, laranja, cenoura, pediu para fazer suco de tarde novamente. Ele ficou muito animado!” – relato de uma mãe de aluno do 1.º ano.

 

“Neste período de ensino a distância, as rodas de conversa e os roteiros desenvolvidos pelos professores permitiram que as propostas pedagógicas fossem alcançadas e nós como pais pudemos acompanhar esse desenvolvimento. Na proposta de olhar pela janela, observei que o Felipe pode dar atenção a detalhes que antes passavam despercebidos por ele, como flores novas e detalhes do local. Ele amou passear de olhos vendados pela chácara, sentindo o vento e ouvindo seu barulho. Experimentou alimentos de olhos vendados, tentando adivinhar o que iria comer com o olfato e depois provando-os. Foram várias descobertas que pudemos desenvolver juntos e que contribuíram não só para o aprendizado acadêmico, como para um novo olhar para a vida e para as coisas, bem adequado ao momento atual que estamos vivendo.” – Cristina Martins dos Reis Cardoso, mãe do aluno Felipe Cardoso – 1.º ano.

 

“Estávamos organizando as atividades em pastas com divisórias (separadamente) e fomos revendo e revisando algumas lições. Me surpreendi, pois o Arthur respondeu várias perguntas sobre o que já havíamos feito há algum tempo, por exemplo: os 5 sentidos, os alimentos reguladores e construtores e energéticos. Estou bem feliz com a evolução e a condução dos trabalhos nessa nossa nova fase. – Deborah Canton, mãe do aluno Arthur Canton – 1.º ano.

 

As descobertas feitas pelas crianças foi o termômetro que recebemos. Esse foi o maior incentivo para continuarmos explorando esse olhar e continuar aguçando a curiosidade nas crianças. Escutar o relato de uma criança dizendo o que aprendeu é enriquecedor. Aprendi algo com essa quarentena: as possibilidades podem e precisam ser as mais variadas e que observar, investigar e experimentar é um exercício que a criança adora realizar. A natureza é “mágica”! É um ambiente explorador! Mesmo a distância, pela janela ou até na cozinha o olhar da criança é encantador, descobridor e transformador.